Entrevista a Nuno Rocha

Entrevista a Nuno Rocha

Nuno Rocha é um realizador português, premiado já por várias vezes a nível internacional pelas suas curtas-metragens. Estudou no Porto, tendo sido mais tarde aceite na Universidade do Texas, nos Estados Unidos. Com experiência em curtas-metragens e também em publicidade, onde realizou trabalhos para a ZON e EDP, por exemplo, Nuno Rocha pode estar agora a caminho da primeira longa-metragem.

Falámos com ele acerca do seu último trabalho, “Vicky and Sam”, totalmente gravado nos Estados Unidos, e sobre os seus projectos futuros. Pelo meio, tempo ainda para uma abordagem ao estado do cinema em Portugal e como é ser realizador neste país.

1. Passaram-se poucos anos desde que terminaste a licenciatura no Porto até alcançares enorme sucesso com a curta-metragem “Vicky and Sam”, premiada várias vezes mundialmente. Entretanto, tempo para o também premiado 3×3 e uma incursão na publicidade para grandes marcas. Qual a fórmula para teres este percurso ainda curto, mas tão cheio de sucesso?
Penso que o sucesso é bastante relativo. No entanto, devo dizer que existindo ou não, depende de um conjunto de factores, que quando aliados da melhor forma, podem ser determinantes em qualquer área. A ambição, a paixão, o trabalho, o método, o timing; diria até que a sorte tem a sua pontinha de importância, ainda que não determinante a longo prazo. O talento, que muitos apontam como a maior causa do sucesso de alguém, não é mais do que a combinação equilibrada de todos estes factores e como cada um consegue relacionar-se com eles.

2. “Vicky and Sam” é o teu mais recente trabalho e foi recentemente disponibilizado para visualização na Internet. O que nos podes dizer sobre esta curta-metragem? Como chegaste àquele conceito?
Ao contrário de outros trabalhos que tenho feito, quando me debrucei sobre esta história, estava apenas e só concentrado na criação do argumento que viria a realizar. Fiquei isolado em casa durante alguns dias onde esbocei várias histórias, mas nenhuma delas era suficientemente boa.  Esta dificuldade levou-me intuitivamente a outra ideia que viria a intitular de  “Vicky and Sam”, onde se projecta de forma ligeiramente diferente a luta do argumentista na fase de criação. Apesar de eu estar sozinho nesta caminhada, “Vicky and Sam” teria vários protagonistas (argumentistas) debruçados no mesmo argumento, sentindo a mesma dificuldade característica de quem escreve.

O guião foi escrito em português, e depois traduzido logo a seguir para Inglês, com a ajuda do meu assistente de realização Adam Morgan. Em relação à produção propriamente dita, foi tranquila apesar de cansativa. Foram vários dias de rodagem com uma equipa americana em solo americano. O sound design masterizado em 5.1 foi conduzido pelo Marco Conceição já em Portugal. Tive uma equipa excelente a todos os níveis em toda a fase de produção.

3. É notório que valorizas muito a criatividade nos teus vídeos. Onde encontras a tua inspiração para o que realizas e escreves?
Um mau argumento dificilmente dará um bom filme, como tal, sou capaz de passar tanto tempo em volta de uma história, como na produção dela.  É preciso que o guião que tenho à frente, justifique todo o trabalho que vou ter a seguir.

Tenho uma certa tendência para dar um carácter fantástico às histórias que escrevo, mas tem a ver sobretudo com a grande influência que tenho neste tipo de narrativa.

4. Em 2009 partiste para os Estados Unidos para estudar na Universidade do Texas, acabando por filmar lá o teu mais recente trabalho. Achas que é no estrangeiro que está a solução para realizadores portugueses que não se conseguem mostrar em Portugal? Isto é, é fácil ser realizador em Portugal?
Qualquer pessoa que pegue numa câmara com um propósito de filmar alguma coisa já se pode considerar um realizador. No entanto, viver desta função é uma realidade bem diferente. Em Portugal não há espaço para realizadores, ou melhor, esse espaço existe mas é muito restrito. Em dois anos que a Produtora FilmesDaMente está no activo, apesar das centenas de currículos que recebemos, ninguém se identificou como sendo apenas e só, realizador. Simplesmente porque os poucos que existem estão em Lisboa a trabalhar em publicidade ou a aguardar subsídios para fazer cinema.

A situação económica do país também não ajuda esta área e se já era difícil alguém chegar a realizador a tempo inteiro, agora essa tarefa torna-se ainda mais complicada. A solução poderá passar de facto por uma solução fora do país, dependendo é claro da vontade e ambição que cada pessoa tem para a sua carreira como realizador.

5. Pretendes realizar, no futuro, algo em Portugal e/ou em Português?
Sim, está nos meus planos realizar um trabalho de ficção em Portugal e em português, mas não vai ser para já. Actualmente estou a desenvolver um projecto que não será feito nem na lingua portuguesa nem com actores portugueses.

6. O que achas da indústria do cinema em Portugal? Que razões apontas para a dificuldade de Portugal em obter o reconhecimento que outros países europeus já vão tendo?
O grande problema que se põe para o cinema português não evoluir, ou evoluir de forma lenta, tem a ver sobretudo com a mentalidade das pessoas que estão à frente dos projectos. O nosso cinema é normalmente egoísta, desprovido de sensibilidade e afastado do público, e quando o tenta ser, são cópias vergonhosas do cinema de Hollywood. O cinema Português não tem de ser nem virado para o umbigo dos realizadores, nem uma tentativa desesperada de chamar espectadores. Ele  deveria ser algo ali no meio, altruísta, sensível, à procura de um público que quer ver uma boa história e tecnicamente bem feito, seja ele nacional ou internacional. Felizmente há uma nova geração de realizadores que já se apercebeu que este é o caminho, e apesar de lento, o progresso está a acontecer; vejo essa vontade nos novos estudantes de cinema e jovens realizadores a dar os primeiros passos. No entanto, vão continuar a haver realizadores que vão manter a sua linha de raciocínio em relação aquilo que pensam que é o cinema e como ele se deve comportar.

7. Depois de duas curtas-metragens premiadas e de alguns anúncios publicitários, faz parte dos teus planos realizar uma longa-metragem?
Sim, estou neste momento a escrever a minha primeira longa-metragem de ficção.

8. Fala-nos um pouco do que é e de como surgiu o Filmes da Mente. 
A produtora FilmesDaMente surgiu da necessidade de criar um projecto que já vinha desde os tempos de faculdade. Começou por ter diversas pessoas envolvidas coma paixão mutua pelo cinema, mas com o tempo algumas pessoas foram saindo até ficar apenas eu e o Victor Santos (co-fundador). Acreditamos neste projecto desde o início, e sentimos que fazia falta algo assim no Porto, com competências na área de publicidade e de ficção. A empresa foi criada há dois anos em plena crise, mas como se costuma dizer, aquilo que não nos mata, torna-nos mais fortes, e felizmente o balanço tem sido bastante positivo.

9. Quais os teus planos para um futuro mais próximo?
O desenvolvimento da minha primeira longa-metragem já está a decorrer, no entanto ainda não tenho datas de rodagem, mas acredito que se iniciará já em 2013.

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Entrevista por Sandro Cantante

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