Top 10 de 2014 por Estefânia Silva

Top 10 de 2014 por Estefânia Silva

Não foi de todo o melhor ano para fazer um Top 10 cheio de diversidade. A verdade é que do pouco cinema a que assisti, poucos foram os filmes que me cativaram (ao contrário de 2013). Exposições foram poucas e poucas merecedoras de menção (um dia faço um Os piores de 2014). Teatro e dança não são de todo algo que eu tenha sequer o direito de comentar, dado o parco conhecimento sobre as matérias. Já música, moda, fotografia e, como toda a gente deveria, sociedade, são temas que me sinto minimamente à vontade para referir. Não olhem para esta lista como estanque. As posição são alternáveis entre si, tendo em conta mais a área em que se encaixam do que propriamente a importância que tiveram para mim. Fiquem então com os meus highlights do ano em questões de moda, fotografia e música.

10# Lara Stone meets Juergen Teller: Smells Like Lara @ System Magazine

10# Lara Stone meets Juergen Teller Smells Like Lara - System Magazine

O porquê desta minha escolha tem mais a ver com o significado que estas imagens carregam e com os intervenientes do que com o resultado final. O Juergen Teller, o enfant terrible da fotografia de moda, e a Lara Stone, que podia muito bem ter o mesmo título, juntaram-se um dia, pouco depois desta ter dado à luz o primeiro filho, para fotografar. A modelo, que no entretanto já tinha sofrido vários contratempos na carreira devido aos quilinhos a mais que ganhou durante a gravidez, aparece ora em roupa interior, ora semi-nua, em poses naturais como se estivesse a relaxar na sua própria casa. Tudo muito bem não fosse a ausência de pós-produção e de qualquer truque no resultado final, deixando à mostra as normais estrias da gravidez, os sinais (demasiadas vezes apagados por photoshop), as gorduras, a celulite, todas as marcas de feminilidade negadas a qualquer modelo que se preze. E isto tudo vê a luz do dia em Novembro de 2014, com uma proximidade quase desconfortável do desfile da marca de lingerie Victoria’s Secret. Ironia? Talvez. Statement? Definitivamente.

9# O regresso de Galliano

9# O regresso de Galliano

A esperança já tinha desaparecido, pelo menos por estes lados. Já se faziam notícias da sua nova carreira como professor e já ninguém lançava boatos sobre ligações a outras marcas. E eis que, do nada, sem que ninguém contasse com isso, nos chega a notícia que o novo director criativo da Maison Martin Margiela é nada mais nada menos do que John Galliano, o designer ingloriamente dispensado da casa Dior e da sua própria marca e que no passado já tinha trabalhado para a casa Givenchy. Controvérsias à parte, a verdade é que o talento de Galliano é inegável e desesperadamente necessário na actualidade da semana da moda parisiense. Mas… de que forma o exagero e a teatralidade francesa de Galliano se vai aliar ao avant-garde “quase” japonês da Maison Martin Margiela? Apesar de me manter um pouco reticente em relação a esta questão, não há nada que aguarde com maior ânsia em relação ao mundo da moda em 2015.

8# O feminismo virou moda

8# O feminismo virou moda

Podemos dizer que é um assunto demasiado delicado para estas linhas. Mas a verdade é que nunca se ouviu falar tanto de feminismo como este ano (pelo menos na era da internet). Seja por discursos inspirados da actriz Emma Watson, por uma das várias TED talks referentes ao assunto, por uma qualquer cantora pop inspirada com conta no twitter, pela quase paradoxal e cómica abordagem ao tema no último desfile da casa Chanel ou qualquer uma das outras referências populares deste ano, toda a gente fala de feminismo. E muitas vezes não só de feminismo, mas de direitos. E falar de direitos é bom pois torna-se não só uma porta para a discussão de ideias e soluções como uma forma de educar a população para o civismo. E, tendo em conta as noticias de intolerância que os jornais nos têm apresentado nos últimos tempos, bem que estamos a precisar de umas aulinhas.

7# Guy Bourdin: Image Maker

7# Guy Bourdin Image Maker

Exposição fotográfica do ano. A todos os fãs de fotografia que só agora tomaram conhecimento disto não desesperem pois têm até dia 15 de Março de 2015 para marcar a viagem a Londres. A exposição, apresentada na Somerset House, embarca todo o trabalho do fotógrafo, incluindo material inédito, vídeos que o próprio realizou em Super 8 das suas sessões fotográficas e até uma amostra do processo criativo por detrás das imagens. Depois das itinerantes The Retrospective e A Message For You, esta é anunciada como sendo a maior exposição de sempre sobre a carreira e vida do protegido de Man Ray e aqui somos obrigados a concordar. Num ano em que também o surrealismo voltou a estar na moda, nada como revisitar o trabalho do precursor da corrente artística na fotografia de moda.

6# Gareth Pugh S/S 2015

6# Gareth Pugh SS 2015

O prémio para melhor desfile da temporada vai para… um espectáculo de arte moderna. Não foi o primeiro (R.I.P. Alexander McQueen) a apostar numa componente mais artística para a apresentação da sua colecção mas, esta temporada, foi claramente o mais bem sucedido. Um caso sincero de aprendiz a superar o mestre, dado que também a colecção per se estava mais inspirada do que a apresentada pelo mentor Rick Owens: uma continuação das linhas minimalistas e elegantes que tem apresentado nas últimas colecções, sem nunca perder o lado sombrio (neste caso inspirado pelo lado negro do folk britânico) e um certo experimentalismo/surrealismo no uso de materiais e padrões. A isso adicionou um complexo espectáculo de luz, som, projecção de imagens e dança contemporânea absolutamente arrepiante que não deixou ninguém indiferente. Não haviam modelos a desfilar no meio dos bailarinos… haviam bailarinos vestidos com peças da colecção (um piscar de olhos ao mentor?). A roupa foi apenas um meio para contar uma história, num cenário muitas vezes enublado. Apesar de perder em criatividade para qualquer apresentação feita pelo Alexander McQueen em vida (ou até mesmo para a Iris Van Herpen com o cenário do desfile de Março deste ano), ganha pontos pelo raro momento de beleza que nos proporcionou.

5# Bölzer @ SWR Barroselas Metalfest

5# Bölzer @ SWR Barroselas Metalfest

Das bandas que mais aguardava ver ao vivo este ano. Apesar de já os ter descoberto tarde, aquando da confirmação para a edição de 2014 do festival Roadburn (Holanda), bastou uma audição do primeiro, e na altura único, EP para me aguçar o apetite para as semanas que se seguiam. Os Bölzer são daquelas bandas difíceis de catalogar, ali entre o death e o black metal revestidos a épico de toada quase bélica. A tempestade que se ouve no EP Aura seria, em teoria, difícil de apresentar com a mesma força ao vivo, mas a verdade é que este power-duo correspondeu a todas as expectativas e elevou-me a um estado de entrega ao vivo que poucos conseguiram este ano. Por aqui já se contam as semanas para os rever no Burning Light Fest em 2015.

4# Willy Vanderperre meets Amenra: A Mon Âme

©stefaan temmerman

©stefaan temmerman

Uma pessoa espera muita coisa da vida, mas nunca esperaria ver uma comunhão tão perfeita entre música extrema e um fotógrafo de moda. O vídeo para A Mon Âme foi uma lufada de ar fresco num universo onde ganha quem tem o vídeo mais ridiculamente satânico. Não fossem os Amenra também conhecidos pelo bom gosto visual, com a escolha de designs simples mas emblemáticos para o seu artwork, a colaboração com o fotógrafo belga, também ele conhecido pelo minimalismo e pela forma como aborda a luz (e pelas campanhas publicitárias para a Dior, Jil Sander e Givenchy), foi logo à partida uma fórmula vencedora. Conta a lenda que foi o fotógrafo que assistiu a um concerto da banda em Paris e ficou de tal forma surpreendido que enviou um e-mail ao vocalista Colin H. van Eeckhout a sugerir a colaboração. Este aceitou de bom grado, depois de perceber a importância da oferta que tinha em mãos. E ainda bem que o fez, pois fomos brindados com aquele que é provavelmente o melhor videoclip de música extrema não só do ano como de sempre.

3# Beastmilk @ The Underworld, Londres

©M.Lazaridis

©M.Lazaridis

Aquando das minhas férias aproveitei para assistir a alguns concertos de bandas que acreditava não ser possível ver, pelo menos tão cedo, em Portugal. De todos (e incluo um sufocante concerto de Gnaw), destaco o concerto de Beastmilk a abrir para Doomriders. Estávamos em 2014 mas podíamos estar muito bem na Londres de 1980. O local ajudava, com o chão de madeira a libertar o cheiro de décadas de cerveja derramada, a escuridão latente e a quantidade considerável de fãs de post-punk lá presentes. Não fosse a minha timidez e tinha copiado o casal gay que na frente do palco distribuía beijos por toda a gente, indiscriminadamente (sem que ninguém tivesse problemas com isso), enquanto balançava os braços no ar e abanava o esqueleto como se a vida dependesse disso. Não que a música e/ou um concerto dos Beastmilk seja alegre… porque não é. Define-se mais como uma droga sonora que nos retira todas as inibições. Imaginem o filme Blade Runner sob o efeito de MD. Conseguiram? Não anda muito longe disso. Não sendo um concerto alegre, permite uma dose de relaxamento única, como poucas bandas hoje em dia o permitem. Um autêntico orgasmo de luxúria pós-apocalíptica.

2# Scott Walker & Sunn O))): Soused

2# Scott Walker & Sunn O))) - Soused

Para mim, o disco do ano. Poucos concordam comigo, talvez porque poucos perceberam que estamos perante um disco que o Scott Walker escreveu a pensar no duo e não o contrário. Logo por aí se percebe que não se pode esperar deste disco algo que este não é: um disco de Sunn O))). Soused apresenta-se como uma obra prima desconcertante, operática, teatral e dramática. Algures entre o musical negro e a ópera acessível, a voz do senhor Scott é a locomotiva desta viagem, servindo o trabalho do (aqui) trio americano como carvão, puxando o imaginário negro um pouco mais além e não deixando que este esmoreça nos momentos de silêncio lírico. Em resumo: os Sunn O))) pouco se notam como a entidade de drone que o são, mas não sendo esse o objectivo, são o pano de fundo perfeito para o Scott Walker continuar a apresentar aquilo que tem mostrado nos últimos discos, sem perder a sua identidade única. E já que falamos em videoclips, aconselho uma vista de olhos ao sufocante vídeo realizado pela franco-austríaca Giséle Vienne para a faixa Brando. Um must-see.

1# Wovenhand @ Amplifest

1# Wovenhand @ Amplifest

Deixemo-nos de coisas: foi o melhor concerto do ano. Alguém lhe encontrou defeitos? Que eu saiba não. Não me vou alongar em descrições ou floreados. Quem não viu, devia ter visto. Tudo foi perfeito, tudo cativou e só foi pena não ter durado o dia inteiro.

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