
PAUS no Cinema São Jorge (12/02/2016)
Fotos por Ricardo Almeida
Nos primórdios da banda, no primeiro EP É Uma Água, os PAUS tinham um tema chamado “Murdo e Sudo”. Pois bem, o público que esgotou o S. Jorge terá saído da sala um pouco mais… surdo. Isso é mau? Talvez, mas já lá vamos. Para começar, importa referir que não poderia ter havido mais contraste com o que se ouviu na primeira parte.
O disco de Cachupa Psicadélica chama-se “Último Caboverdiano Triste” e tem um título completamente ajustado. Quem espera, pelo nome, uma mistura de ritmos de Cabo Verde com algo psicadélico, depara-se com algo bem diferente. É um projecto de um homem só, de Lula’s e da sua guitarra. Músicas simples, com poucos acordes, “para fazer a fotossíntese”. Lula’s fala com o público de forma pausada e arrastada. E, pelo meio, demora quase 2 minutos a afinar a guitarra. Sentimos que, quanto mais, de Cabo Verde traz apenas a morna. E que está mais perto da música inofensiva de um Jack Johnson ou do espírito “paz e amor” da Jamaica. É um tipo simpático, que presta homenagem à família, e fala, com saudade, do mítico Carnaval de S. Vicente. Mas, em termos musicais, a coisa aquece pouco. E o ambiente não deve ter estado menos morno que, à mesma hora, um certo “inferno” para os lados do Alto dos Moinhos.
Pouco depois, surgem os PAUS. Após os primeiros temas, o baixista Makoto fala com o público e diz que a banda está numa bolha em palco e que espera que o público entre nela. É impossível que isso não aconteça. Pelo menos de uma certa forma. Somos abalroados por uma uma corrente esmagadora de som, imprópria para cardíacos, epilépticos ou para quem tenha problemas de ouvidos. Ninguém estaria à espera que fossem meigos. Mas o som tão alto, demasiado alto, era talvez desnecessário. Especialmente numa fase onde a ideia é mostrar que, ao terceiro disco, a bateria siamesa é apenas uma parte, que se mistura cada vez mais com as teclas, com o baixo e… com as vozes. Sim, vozes. Mas, excluindo as catarses mais hardcore, as vozes são quase outro instrumento. Uma forma diferente de marcar o ritmo, de assinalar as pausas. A questão é esta: isso implica um ritmo mais lento e cândido? Não parece…
A ideia que fica é que Mitra é ainda mais violento, tal como o era Clarão (ou o EP de estreia, de onde resgataram “Pelo Pulso”). Por um lado, as frequências extremas dos teclados e os gritos urgentes de “Pela Boca”, single de apresentação, ajudam a reforçar essa ideia. Por outro, parece que o regresso ao primeiro disco traz uma harmonia que sentimos menos nos temas novos.
Ser violento é bom ou mau? Depende do gosto e do ponto-de-vista. Mas nada haverá de mais melódico (e não menos intenso) do que o belo arranque de baixo de “Muito Mais Gente”. E nada mais pop e dançável do que “Deixa-me Ser”. O tema surge no “encore”. Entre aspas, que eles não gostam de encores e colam-no com o resto do concerto. A meio do tema, Hélio canta: “toda a gente se levanta”. E só aqui parte do S. Jorge abandona as cadeiras…
O fecho faz-se com “Mo People”. Dedicado ao público, que esgotou o São Jorge. Como referiu antes Quim Albergaria, é a prova de que é possível gostar de outras coisas, algo indefiníveis e também daí o título Mitra, numa banda que não tem um espaço e um rótulo definido. Podemos até nem ficar convencidos com o disco. Mas, seja como for, a banda continua a trilhar o seu caminho. E foi com ele, sem grandes cedências, que chegaram aqui.