Golden Slumbers na Casa Independente (26/02/2016)

©Martim B. Teixeira

©Martim B. Teixeira

Texto por Henrique Mota Lourenço

Dizer que as Golden Slumbers são um dos novos talentos que mais se destacam em Portugal é um understatement. Há muito que este talento cresce nas irmãs Falcão, embora só agora tenham chegado ao topo da cena indie — The New Messiah, o disco de estreia, atira-as para o patamar justo, o de cantautoras reconhecidas pelos media e pelo meio.

Pouco mudou desde o EP de estreia, as canções pueris sobre o amor e a irmandade (e que bem cantam Catarina e Margarida sobre as discussões comuns em Stubborn) continuam a ser-nos servidas com o mesmo à vontade e sapiência de quem estudou os novos fenómenos do Country — fala-se obviamente de Jake Bugg e da wittiness que só se aprende em terras de Sua Majestade. Sem pudores, as Falcão colocam a voz onde lhes é pedido, têm um dom que vem de berço e que fazem questão de aproveitar da melhor forma: nos dias de hoje a sua banda é formada, à exceção do baixista Tiago Coelho, por profissionais: Benjamim — que produziu o disco de debute da banda —, António e Zé Guilherme Vasconcelos Dias apimentam o que mesmo dantes não seria pãozinho sem sal, com particular destaque para as linhas uptempo de bateria — que ora vão buscando as vassouras ou as baquetas consoante o que pede o alinhamento. Não há dois drum fills iguais, e isso é raro em bandas novatas como esta.

Love ou Don’t Listen combatem ao vivo a efervescência óbvia do single orelhudo que levou as as Golden Slumbers a integrar as playlists das rádios jovens como a Antena 3 ou Vodafone FM. À partida parece difícil igualar uma canção bem sucedida, mas não há nada que não se faça: ora se pede um coro aqui, ora se chamam mais familiares e amigos para subir ao palco e dar corpo às canções que só por si já têm forma, mas que num espaço tão pequeno (e com uma acústica que estraga indiscutivelmente todo o trabalho de semanas de ensaios) podiam acabar por simplesmente fluir sem deixar rasto no já longo alinhamento.

Para o fim, e como manda a regra, fica a cara do disco: New Messiah, tema homónimo, guarda nos corações um serão mais do que “fofinho”, que é como muita gente escolhe definir o trabalho de Catarina e Margarida. Embora se vislumbre evidentemente alguma ternura, é maior o profissionalismo e a entrega do que qualquer nuance que os seus arranjos possam ter.

Os dois registos de estúdio lançados até agora pelas Slumbers são consistentes, têm muito sumo por beber e muitas lições a tirar. Não só pelas letras, mas pelo tradicionalismo na feitura da canção: gerou-se o consenso de que para escrever música com relativo sucesso no meio alternativo era necessário colar dezenas de pedais num palco ou criar letras minimamente aprimoradas em português, mas as irmãs Falcão provam que não é bem assim. Catarina e Margarida são só um dos exemplos que mostram que o novo cançonetismo não se faz só em português, e que as guitarras acústicas também vivem com força num inglês bem trauteado — são sem dúvida um dos exemplos a seguir nesta geração que sucede Noiserv ou os Sean Riley and The Slowriders, representantes mais altos do que é escrever bem numa língua restritivamente maternal.

Arte-Factos

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